Pneumotórax

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Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.

A vida inteira que podia ter sido e que não foi. 

Tosse, tosse, tosse. 


Mandou chamar o médico:

- Diga trinta e três. 

– Trinta e três… trinta e três… trinta e três…

- Respire. 


– O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
– Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax? 

– Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
(Manuel Bandeira)
Fui chamado às pressas para atender o paciente.
 
Ao chegar notei que o problema era grave, mas não incurável.
 
Analisei os sintomas. Febre recorrente. Tosse. Cansaço. Dores no corpo.
 
Auscutei o coração, depois os pulmões.
 
O paciente informou que há meses vinha tomando xaropes  e antitérmicos. Mudara de marcas várias vezes, em algumas sentira melhoras mas, passado um tempo, os sintomas voltavam.
 
“- O senhor está jogando dinheiro fora com esses medicamentos. Seu caso é de pneumonia, precisa tomar antibiótico para resolver a causa, não os sintomas.
 
O paciente me ouviu sem questionar. Prescrevi o antibiótico fui embora.
 
Alguns dias depois liguei para saber como ele estava.
 
“- Sabe doutor, eu fui até a farmácia e descobri que aquele remédio que o senhor mandou tomar é caro. Além disso, são injeções e eu detesto injeções…”
 
“- Eu entendo, mas se o senhor quiser sarar esse é o único caminho.”
 
Esperei mais uns dias e liguei de novo.
 
“- Pois é doutor, eu conversei com a minha mulher e a gente resolveu que não vai tomar esse remédio que o senhor deu. Os xaropes não funcionam mas, pelo menos, são mais baratos e não doem.”
 
“- O senhor entende que fazendo isso está colocando a sua vida em risco?”
 
Nesse momento o paciente se exaltou.
 
“- Doutor, eu chamei o senhor aqui para me dar um xarope que funcionasse, não para mandar eu tomar injeções.
 
Resolvi não insistir mais e esqueci do assunto.
 
Na semana passada encontrei a mulher do meu paciente no meio da rua. Perguntei a respeito dele.
 
“- Ah doutor, ele morreu três meses depois daquela sua visita. Pneumonia aguda, embolia pulmonar e falência múltipla dos órgãos.
 
Apresentei as minhas condolências, mas sem me condoer demais, pois ainda fui obrigado a escutar:
 
“- Se pelo menos o senhor tivesse dado um xarope bom para ele…